segunda-feira, 24 de novembro de 2014

E para manter o portugUês vivo?

Gente, recebi um comentário tão legal de Monica, do Brasileirinho, que resolvi escrever mais um pouquinho sobre essa história de bilinguismo...

Dizem que a língua materna é a língua do coração, aquela que você começa a aprender no colo da sua mãe, ainda bebê. Ela não é formada apenas por palavras, mas também por carinho, gestos e ritmos. É embalada pelas festas anuais e ganha significados próprios de acordo com a cultura de cada região.

Tenho uma amiga brasileira que teve seus filhos na Alemanha. Eu lembro como fiquei impressionada com a filhinha dela, que conheci em umas férias que passaram no Brasil... A garotinha falava um português perfeito, tinha um leve sotaque nos "Rs" e nada mais!

"Como é que pode?", perguntei para a minha amiga, "Ela tem aulas de português?". Não, a menina não tinha aulas formais de português, mas escutava a mãe falar com ela em português todos os dias! E, vamos combinar, quando eles são bem novinhos, a comunicação com a mãe é o negócio mais importantes da vida, né?  ;-)

Mas depois que vão crescendo, fazendo amizades, descobrindo o mundo, outras pessoas vão ocupando esse espaço que era privativo dos pais. E, se essas pessoas se comunicam em outro idioma... A língua materna perde um pouco do seu status. Divide a sua importância com o outro idioma, perde terreno.

E o que podemos fazer para ajudar?

Acho que a melhor ajuda é resgatar, nas crianças, o interesse pelo idioma natal. E apenas falar com elas em portugês não é o suficiente para isso! Tem que trazer um pouco daquele "colo de mãe" de volta a ativa. Tem que trazer de volta um pouco do ritmo e da cultura associados ao idioma e "abraçar" a criança com eles.

Por isso as manifestações culturais associadas ao idioma materno são tão relevantes. Ainda mais se elas resgatam boas lembranças nas crianças! Aqui em Auckland temos a sorte de ter uma comunidade brasileira bem organizada e ativa, com celebrações de datas como o São João e o dia das crianças - falando nisso, já estou até meio ansiosa para ver o que vai rolar no Carnaval!  ;-)

Os brasileiros organizam encontros regulares e até aulas de português para crianças (links abaixo!). E eu sei que as bibliotecas aqui incentivam e abrem espaço para manifestações culturais de outros países. Na próxima vez que for lá na biblioteca, vou peguntar a respeito...

Também vou ver se nas férias consigo colocar os garotos na capoeira. Acho que as aulas são em inglês, mas aposto que as rodas são cantadas em português. E quer algo melhor que música, palmas, coro e um jogo de corpo inteiro para se conectar com nossa cultura?! Só espero que a turminha de capoeira não pare durante as férias escolares.

Agora, uma ferramenta que tenho usado bastante são as histórias (benditos sejam os livros infantis em português que trouxemos do Brasil!). A noite, antes de dormir, só vale história em português, né?  :-)   Ainda bem que quando eles querem que eu leia algum livro daqui, pedem para eu ler traduzindo para o português. Confesso que, depois de um dia cansativo, nem sempre a tradução sai legal, mas pelo menos nossa língua vai com eles para o sono...

Outra atividade que deve ajudar pra caramba são os skypes com a família e amigos do Brasil. A diferença de fuso atrapalha e não temos feito muitos, mas esse contato com certeza é um grande incentivo para as crianças manterem o português latente dentro de si!

Os CDs e DVDs também ajudam. Trouxemos vários, mais de 200 e, apesar de ter tido vontade de desistir e deixar todos quando estávamos naquela loucura de preparar as malas para a mudança, estou muito, muito contente que eles vieram! :-)  Fico me perguntando apenas se algum dia os meninos vão pedir para assistir os fimes com "som original"... Será?!

Termino com locais onde é possível exercitar/vivenciar o português aqui em Auckland:

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Portuglês chegando

Já ouvimos várias recomendações de outros brasileiros - e também de praticamente todas as professoras e educadores com os quais tivemos contato - com relação a falar em português com os meninos.

No início eu achava engraçado, afinal, mal havíamos chegado, os garotos ainda nem entendiam inglês direito, e o pessoal já perguntava: "E como está o português deles?". Quando fazíamos aquela cara de "Ué, por que a pergunta?!", diziam: "Ah, é que vocês acabaram de chegar... Espera um pouquinho pra ver."

Bom, acho que o pouquinho já passou! Mudamos a menos de 8 meses e eu percebo agora porque taaaantas recomendações com relação a manter viva a língua materna...

As crianças são uma esponjinha e, em geral, após alguns meses, todos eles apreendem o novo idoma. Antes de virmos, alguns amigos nos deram até um roteiro básico do que esperar:
  • No primeiro mês eles não falam nada (do novo idoma).
  • No segundo mês, ainda não falam, mas parecem já entender alguma coisa.
  • No terceiro mês começam a falar algo e depois disso... Não param  mais!
Com certeza, cada criança é única e esse roteiro básico pode apresentar diferenças. Aqui em casa mesmo, um dos garotos já chegou falando (apesar de só ter estudado inglês por uns 2 meses nas aulinhas da escola) e o outro só soltou mesmo a língua depois de entrar na escola (uns 5 meses depois de chegarmos).

Mas o fato é que eles aprendem, ou melhor, incorporam a novo idioma muito rápido e, se a língua materna não é usada... Já sabem, né? Em casa, mesmo falando português com eles todo o tempo, noto que já houve um certo retrocesso na maneira como usam nossa língua.

O uso dos pronomes, por exemplo, está falhando. É um tal de "Dá isso pra eu" que se repete o tempo todo, não importa o quanto a gente diga "Dá para mim, menino!". Mas o marco tragicômico da preocupação com o uso do português veio quando estávamos no carro, voltando para casa, há algumas semanas atrás. Martim, que sempre gostou de observar o trânsito, de repente falou assim: "Pai, pai, passa aquele vermelho carro!". 

Depois, quando comentei o ocorrido com ele, o garoto deu umas boas risadas e, do jeito que ele é, duvido que cometa o mesmo equívoco novamente. Mas ontem, quando o caçula Caio perguntou pelo irmão falando "Ele está na dele casa?", eu comecei a desejar que as nossas férias no Brasil não demorem tanto tempo para acontecer...

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Não confie na primavera!

É, não confie não!... Ela chega cheia de flores, brilho, cores e sol e quando você está bem tranquilo, achando que já pode colocar as roupas de frio no fundo do armário e dar férias para o aquecedor... Olha aí o resultado:
13 graus lá fora, um vento frio de lascar e nem um tiquinho de azul no céu...  :-(

Hunf! Se as estações fossem pessoas, a prima Vera seria aquela parente duas caras, que chega distribuindo rosas e abraços calorosos só para ganhar espaço na sua vida, na sua casa, no seu coração. Então, depois que você baixa a guarda e confia nela, pensa que maravilha é tê-la consigo, a dissimulada dá um sorrisinho e coloca as garras de fora!

Leva seus filhos para brincar lá fora de calção e camiseta e devolve-os doentes... Fecha o tempo de repente e você tem que cancelar todo o programa do final de semana... E, como se não bastasse, vez por outra convida sem aviso o Sr. Inverno - aquele moço frio, sombrio e muito CHATO - para o jantar!

Falando sério, a primavera é uma estação bonita, mas muito instável. As temperaturas aqui em Auckland variam, em média, de 18 a 11 graus, mas já tivemos dias com 24o e noites com 9o! O tempo costuma mudar de repente, então, convém manter os casacos e capas à mão e ter sempre um programa alternativo para os passeios ao ar livre...

Agora eu entendo porque, mesmo em dias ensolarados e quentes, ouvimos o pessoal que mora aqui dizendo "Ah, e quando o verão chegar...". Pelo visto o verão é um camarada com personalidade bem mais forte e definida que a prima Vera, né?  ;-)

quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Enquanto isso, as notícias ressaltam o Brasil...

Sim, todos os jornais daqui têm mencionado o Brasil nos últimos dias... Hoje, as notícias envolvendo a pátria amada abriram o jornal da tarde! E elas não falavam da vitória da seleção, não (apesar da vitória da seleção também ter sido destaque no bloco sobre esportes! Mostraram todos os gols e contaram da volta de Dunga). Mas o que os jornais daqui realmente destacaram foi a eficiência da nossa Polícia Federal na captura do fugitivo John Smith.  :-)

John é um pedófilo assassino que conseguiu fugir da Nova Zelândia na quinta-feira passada. As autoridades neo-zelandesas tem sido bombardeadas pela imprensa local por conta do episódio. Até o primeiro ministro, John Key, precisou desculpar-se recentemente por conta de uma piada sem graça que fez sobre o assunto. Então, a "experiência das autoridades brasileiras na captura de fugitivos" deve ter deixado todos muito gratos.

E, obviamente, me encheu de orgulho!  :-)

Um orgulho que eu não sentia desde as primeiras imagens da ocupação do Morro do Alemão, no Rio de Janeiro (apesar de todas os controversos aspectos do tema!). O fato é que se não respeitamos a nossa polícia, se não confiamos nela, que esperança podemos ter na nossa segurança, na segurança da nação?

E ouvir as autoridades de um outro país elogiando a nossa Polícia Federal em rede nacional (antes das notícias sobre nosso futebol) é reconfortante e animador!

Agora, só espero que o judiciário siga o exemplo e desembarace a deportação do sujeito rapidamente. Afinal, se demorarem muito, é capaz dele resolver vir por conta própria depois de conhecer o presídio Ary Franco...

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Diferenças culturais - Enquete

Dessas diferenças culturais todas a que eu mais senti foi a mudança da refeição principal do almoço para o jantar... Para falar a verdade, ainda não me acostumei com o "pequeno lanche" que eles fazem aqui no meio do dia (sinto falta de "comida de verdade", para comer com garfo e faca!), nem tampouco me acostumei com arroz-com-feijão toda noite.

Na minha família, a gente normalmente tinha uma ceia a noite, com pão, queijo, leite e um prato quente como sopa, inhame, macaxeira, batata doce, tapioca, cuscuz... Jantar mesmo, só em ocasiões especiais.

Caio é como eu, e de vez em quando ainda pede para levar "almoço" para a escola. Não sei como ele curte comida de panela (carne, arroz, feijão, etc) fria, mas a marmita normalmente volta vazia! Diferente dos dias em que mando sanduíche - eu faço o sanduba dele só com 1 fatia de pão e ainda assim quase sempre volta um pedaço...

Já Martim, que nunca foi chegado em comida de almoço, adorou a mudança! E, depois de um tempo se alimentando basicamente de frutas, iogurte e pão, começou a pedir carne com arroz na janta!  :-)

É... um negócio é certo: a gente se acostuma com (quase) tudo!

E a parte boa dessas mudanças é o exercício de adaptação, o treino na flexibilidade. Sair da zona de conforto e procurar conforto em outras rotinas, de outras maneiras, com outros sabores...

Difícil? Hum, às vezes é sim, mas quando acho as diferenças culturais difíceis de engolir, gosto de pensar no que uma outra brasileira me falou um dia desses: "tente ficar com o melhor dos dois mundos".  ;-)

Agora, uma curiosidade: o que foi/seria mais difícil para você?
Que diferença cultural exigiu/exigiria mais da sua capacidade de adaptação?
Pode votar na enquete aí do lado!  :-)

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Diferenças culturais - "sim" é sim e "não" é não... Né não?

De onde eu venho, entre um "sim" e um "não" existe um milhão de possíveis significados... Por exemplo, um "nããão" com beicinho, já é quase um "sim", basta apenas perguntar de novo! E um "sim" emburrado e de bate-pronto é pior que um "não", né não?   ;-)

Na Coréia, os "sims" e "nãos" também são flexíveis e Sam estava bem preocupado com isso, uma vez que para os kiwis "sim" é sim e "não" é não - simples, claro, direto e fim de papo. Não há entrelinhas e ninguém pergunta de novo!

Aparentemente, a maior preocupação de Sam está ligada a consultas médicas... Quando um médico, no meio da consulta, pergunta a um coreano "Você entendeu?", é quase certo ele receber como resposta um rápido e sorridente "Yes, yes", que significa algo como "Não sei... Talvez... Acho que não, mas não estou confortável para perguntar nada". O problema é que se o médico for kiwi, a tradução será literal e, se o paciente compreendeu tudo, por que danado ele explicaria de novo?!

Então, só para saber se você entendeu o que estou falando, imagine que você acabou de chegar na casa de um kiwi colega seu. São umas três da tarde e você almoçou muito bem, ainda vai demorar para ter fome de novo... O seu colega está finalizando uma maquete detalhada do próximo parque da cidade e de repente lhe pergunta: "Quer um docinho?". O que você responde?

Bom, eu responderia que não, não só porque não estou com fome, mas também (talvez principalmente!) porque acabei de chegar e não ia querer atrapalhar o trabalho do rapaz, né?  :-)

Então o kiwi, depois de ouvir o meu "Não, não precisa", interrompe o trabalho de qualquer forma, vai lá na cozinha e volta com um pratinho de doces estupendos, daqueles que dão água na boca só de olhar, que a avó dele trouxe diretamente da nova doceria super chique que abriu na rua... Ele se senta no sofá do seu lado e vai conversando e comendo sozinho os docinhos, bem tranquilo...

Está esperando que ele ofereça de novo?!   E s q u e ç a.
Aqui ninguém entende aquela história de negar três vezes a comida antes de dizer "Sim, eu quero". :-)

E se, no final de um jantar com vários amigos, naquela hora em que a mesa fica cheia de várias conversas ao mesmo tempo, o anfitrião kiwi perguntar "Quem quer café?", é melhor parar a sua conversa no meio e dizer que quer em alto e bom som, pois ele vai perguntar uma única vez e preparar a quantidade exata de xícaras para servir apenas quem respondeu que sim...

Agora, tem umas vantagens nessa maneira direta de encarar os "sims" e os "nãos": crianças kiwi normalmente não ficam insistindo interminavelmente quando querem algo e você nega - "não" é "não". Ponto.

Sam veio da Coreia para cá há 20 anos atrás, acompanhado da esposa e de uma filha. Depois que estavam morando aqui tiveram um menino e Sam conta que o garoto, apesar da influência dos pais (ambos coreanos), percebe os "sims" e os "nãos" de maneira completamente diferente da menina.

Diferenças de gênero a parte, pensando nisso tem vezes em que eu quase queria que os garotos tivessem nascido aqui...   ;-)

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Diferenças culturais - Sem sobras!

Então, hoje volto aos comentários de Sam!... :-)

Outra diferença cultural que ele compartilhou conosco, também relacionada à comida e a socialização que ela pode (ou não!) proporcionar, foi: aqui normalmente não há sobras, isto é, os kiwis costumam preparar a quantidade de comida exata para servir às pessoas que moram com eles, ou que eles convidaram para suas casas.

Parece uma boa prática, não é mesmo? Afinal, evita o desperdício de comida! Mas tem duas consequências com as quais nem Sam, nem a gente está acostumado...

A primeira é que ninguém "fica para o jantar", não existe aquela história de "colocar mais água no feijão". :-)  Aqui, como em vários outros países onde o horário escolar termina no meio da tarde, a principal refeição é a janta (o almoço normalmente é apenas um pequeno lanche) e não espere que coloquem nenhum prato extra na mesa de última hora! Aliás, se você estiver na casa de kiwis depois das 17:30h, saiba que pode estar sendo inconveniente - é possível que eles estejam só esperando você ir embora para poderem jantar!

Minha professora de inglês, uma kiwi super simpática, falou que essa cultura tem origem na recessão dos anos 30, que atingiu fortemente o país. A comida tornou-se escassa e as crianças dessa época aprenderam na prática a não desperdiçá-la. Esse aprendizado foi mantido e repassado às gerações seguintes, mesmo após a melhora na economia, e, agora, parece ser algo incorporado à cultura da nação.

Sam percebeu a segunda implicação dessa postura anti sobras dos kiwis ao ser convidado para festas e descobrir que a sua família não estava inclusa no convite! Sim, os convites aqui costumam ser nominais. E, se você pretende levar alguém mais consigo, convém entrar em contato com o anfitrião antes e conversar a respeito.

Tenho que admitir que essa maneira de ser deve facilitar bastante a vida de quem está organizando a festa, mas confesso que achei muito estranho quando Caio (e apenas ele!) foi convidado para o aniversário de um amiguinho do jardim de infância. O convite dizia assim: "Drop off, please", o que, traduzindo, significa: Deixe apenas o convidado, por favor. Em outras palavras: pai, mãe e irmãos não inclusos!

Agora, me digam, como é que eu explico para Martim porque apenas o irmão dele pôde ir para a festinha?!?